Leia o texto abaixo. No verão saímos da praia muito depois das outras crianças e dos outros pais. A areia, no alto junto à estrada, queima os pés, e toda vez a corrida final cheia de gritos é a alegria que encerra a manhã. Chegando à calçada sacodem-se as roupas, as toalhas, bate-se com força os pés no chão, em pequeno cerimonial do qual participa toda a família. Eu visto uma roupa leve, macia de muitas lavagens, abotoada na frente, clara. [. ] Sinto a pele áspera de sal. A água escorre fresca dos meus cabelos [. ], o vestido se cola sobre as costas e os ombros, segunda epiderme grossa e enrugada. O calor parece nascer do chão. No sol a pino, quase não temos sombra. O hotel não é muito longe; vamos a pé pela avenida que beira a praia [. ]. O calor caminha conosco [. ] No fundo da avenida, a praia é dos pescadores. Os barcos alinhados sobre a areia, as velas recolhidas, as redes abertas ao sol para secar, dormem, parados, à espera de que a tarde traga o terral e possam fazer-se ao mar. Não se vê ninguém; nós somos os últimos. Atravessamos a pracinha ensombrada de pinheiros. Respirando fundo [. ], mergulhamos no ar subitamente leve, já aliviados do calor, já chegando. No hotel almoça-se do lado de fora [. ]. A fome, contida durante tantas horas, não é mais premente, mas funda, misturada ao cansaço, confuso torpor. Há o cheiro de flores no calor, de peixe frito, de tantas pessoas vindas da praia. No ruído de pratos, talheres, vozes [. ], meu corpo, mole de tanto sol, vai ficando vago, perde seus contornos, e eu continuo, ali, o longo boiar da manhã, com o mar nos meus ouvidos, num desejo de mar para o dia seguinte. COLASANTI, Marina. Eu sozinha. São Paulo: Global, 2018. Fragmento. O desfecho dessa narrativa acontece quando a narradora avista os barcos dos pescadores. Chega no hotel. Deseja voltar na praia no dia seguinte. Sai da praia. Sente o cheiro de peixe fresco